Ficha Técnica:
Direção: Guillermo Del Toro
Roteiro: Guillermo del Toro (baseado no livro Frankenstein, The Modern Prometheus, de Mary Shelley)
Produção: Guillermo del Toro, J. Miles Dale, Scott Stuber.
Distribuição: Netflix (exibição limitada nos cinemas + streaming)
Gênero: Terror / Ficção Científica / Gótico
Idioma: Inglês
Classificação Indicativa: 18+
Sinopse
Um cientista brilhante, mas egocêntrico, dá vida a uma criatura em um experimento monstruoso que acaba levando à destruição do criador e de sua trágica criação.
O que há de diferente nessa nova adaptação de Frankenstein, de Mary Shelley?
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| Divulgação / Netflix |
Depois de tantas versões anteriores, poderia facilmente ser “apenas mais uma”. Para quem não conhece profundamente o trabalho e a cinematografia de Guillermo Del Toro, talvez se esperasse um filme de terror com um elenco de peso. No entanto, o longa ultrapassa esse estereótipo e mergulha em uma profunda reflexão sobre o que é a humanidade. Afinal, somos o reflexo de nossos criadores? Até onde ambição e antiética caminham lado a lado?
O filme é impecável em sua estética visual, com atenção especial às sutilezas dos detalhes. A fotografia gótica e o figurino inspirado no século XIX se misturam a uma visão lúdica e contemporânea. Todo esse trabalho é assinado pela cenógrafa e figurinista Kate Hawley, conhecida por A Colina Escarlate e Máquinas Mortais. Hawley revelou recentemente que suas principais inspirações foram o romantismo, a obra original de Mary Shelley, além de referências de artistas como David Bowie e Prince. O objetivo era evidenciar a proximidade entre Victor Frankenstein e as artes, já que o personagem transita entre ciência e criação artística ao conceber a Criatura.
Falando em arte, o elenco não poderia ser mais adequado. Oscar Isaac entrega exatamente o que o papel exige: um cientista excêntrico e ambicioso. No início, o espectador até sente empatia por ele ao ver sua origem e suas motivações, porém, ao longo da narrativa, o filme aprofunda a complexidade de sua mente, mostrando até onde ele ultrapassa os limites éticos em nome de seus objetivos. Também destaca o quanto ele permite que seus sentimentos afetem suas ações, gerando consequências que moldam diretamente a Criatura.
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| Divulgação / Netflix |
E, falando em atuação, Jacob Elordi se supera novamente. Quem o vê hoje dificilmente lembra o traumático passado em A Barraca do Beijo. Sua interpretação como a Criatura é, facilmente, uma das melhores atuações do ano. Ele retrata com maestria um ser recém-nascido para o mundo: puro, inocente, mas incapaz de se encaixar em uma sociedade que nunca irá aceitá-lo. Essa pureza é reforçada pela relação com Lady Elizabeth (Mia Goth), uma personagem religiosa que enxerga na Criatura a essência humana: alguém que simplesmente não pediu para existir.
A evolução da Criatura é tratada de forma quase filosófica: até onde o mundo pode corromper alguém? O personagem mantém a pureza até ser pressionado pela violência humana, e, ainda assim, seu coração permanece intacto. Sua busca pela aprovação do criador e pela compreensão de seu propósito ecoa temas profundamente religiosos. É praticamente uma representação da relação entre a criação e a divindade, sempre questionando: “Para que fomos criados? Qual é o nosso propósito?”.
O filme levanta mais questões do que oferece respostas, aproximando-se muito mais da obra de Mary Shelley do que qualquer outra adaptação. E isso é revelador, especialmente se compararmos com versões populares, como o monstro de Van Helsing (2004). Nesta nova leitura, Del Toro preserva o verdadeiro legado deixado por Mary Shelley.
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| Divulgação / Netflix |
Definitivamente, não é um filme sobre terror. É sobre relações humanas, ética, compaixão e complexidade emocional. Mia Goth está extraordinária como Lady Elizabeth, a personagem que representa a ciência e a religião caminhando juntas. Sua piedade pela Criatura quase beira o sagrado. Sendo uma observação sensível de como, culturalmente, as figuras maternas tendem a ser mais compassivas diante da dor.
Christopher Waltz (Bastardos Inglórios) interpreta Henrich Harlander, o patrocinador das pesquisas de Victor Frankenstein. Felix Kammer (Nada de Novo no Front) dá vida a William Frankenstein, irmão e parceiro de Victor, além de noivo de Lady Elizabeth. Já Charles Dance (Game of Thrones) interpreta o pai dos dois. Todos entregam atuações sólidas e realistas.
Quanto à trilha sonora e à estética geral, tudo carrega a marca registrada de Guillermo Del Toro. Seu dom de transformar histórias de premissa “estranha” em obras poéticas permanece intacto. Por isso, este Frankenstein dialoga tão bem com sua adaptação de Pinóquio para a Netflix, ambos profundos e sensíveis.
Nem tudo é perfeito…
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| Divulgação / Netflix |
O início do longa busca desenvolver a relação de Victor com a ciência, sua ambição e os personagens centrais da trama. Porém, mesmo sem ser extenso, essa introdução pode soar letárgica, quase como um filme à parte. O espectador pode sentir certo cansaço, apesar do interesse que o tema desperta. E o mesmo se aplica a partes do filme, onde parece que o longa dura mais de 2h30, mas ele está apenas em um ritmo lento.
Em algumas cenas, maquiagem e efeitos visuais podem incomodar levemente, embora nada que atrapalhe a experiência, são apenas detalhes perceptíveis a um olhar atento. Há também transições bruscas entre drama, ficção e horror, dando a impressão de gêneros separados, ainda que seja apenas uma observação pontual.
Veredito
No fim, o longa é uma obra que respira a essência de Guillermo Del Toro e a alma escrita por Mary Shelley. Não é um filme de ação ou terror, é uma jornada filosófica sobre ambição, criação e o desejo profundo de existir com propósito.
Afinal somos movidos por aquilo que buscamos: Victor ansiava superar o pai e a Criatura ansiava ser vista por ele. Ambos carregavam a mesma fome, a de significar algo para alguém.
Sendo assim, o filme nos lembra que até o ser mais frágil guarda um propósito, e que muitas vezes somos apenas o reflexo das ambições daqueles que nos moldam. A criação herda a ambição e intensidade do criador, logo o ciclo continua, belo e trágico.
Disponível em: Netflix.
Nota Final: 9.5/10
Fonte: Rolling Stones Brasil / IMDB / Netflix





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